Bem-vindo à era das marcas politicamente (e deliciosamente) incorretas

– Ô professor, estou planejando abrir uma hamburgueria na cidade.

– É mesmo? Que legal! Como vai se chamar?

– Whatafuck!

– Como assim?

– Sim! Whatafuck!

– Nossa, cara! Você tá louco? Tenho receio!  Acho melhor não! Como assim? Que nome é esse? Vai abrir uma lanchonete tem um palavrão como nome da marca? Acho que perigoso e arriscado. Pense mais um pouco! Ainda mais em uma cidade como Curitiba, onde o povo é meio conservador pra essas coisas, não?

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Esse diálogo aconteceu há quase 2 anos. Eu sou professor de branding da pós-graduação da PUC Paraná, e conversava, na ocasião, com Daniel Mocellin, meu aluno na época. No topo de minha autoridade conceitual e acadêmica quis dar uma resposta politicamente correta para ele. Ledo engano. Mocellin seguiu sua intuição. Hoje ele hoje virou um grande amigo e ainda bem que minha opinião entrou em um ouvido dele e saiu pelo outro. O Whatafuck nasceu! Nasceu não, decolou!!! E decolou alto!

wtfEm menos de 2 anos de vida, já abriram o Roots, uma “spin off” do Whatafuck e que serve batata frita no cone ao melhor estilo belga. Em todas as lojas, eles têm 27 torneiras de chope, onde já encheram copos com mais de 90 mil litros de chope em quase 20 meses de história. Eles venderam 184 mil hamburgers no ano passado. O Whatafuck é a melhor hamburgueria segundo o Swarm Curitiba. Também são TOP 80 no Trip Advisor e o melhor de Curitiba, categoria Geral no YELP. A rede hoje emprega hoje 31 funcionários. Já lançaram a cerveja própria (uma APA saborosíssima) e já estão pensando em fazer um tênis em colaboração com uma outra marca com o mesmo DNA. Se teremos Whatafuck em São Paulo? Sim, eles pensam nisso!

Nesse início de ano, a marca não parou de inovar e de crescer, e sempre com a pegada arrojada e pensando fora da caixa. Inauguraram uma nova unidade, no Shopping Hauer, local tradicional da cidade de Curitiba e que já reúne diversos empreendimentos gastronômicos. O Whatafuck, que usualmente já recebe quase todos os dias uma mini multidão na calçada da loja da Rua Vicente Machado, decidiu fazer uma promoção no dia da abertura: os primeiros 500 clientes que comprassem um hambúrguer simples pagariam apenas 1 real pelo sanduíche (o valor normal é 10 reais). Na data da inauguração, o bacon nos sanduíches também foi gratuito. Será que tivemos a casa lotada?

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Os sócios do Whatafuck: o torcedor do Furacão, Gui Requião, e Daniel Mocellin, viciado em NBA e que jura não ser hipster.

Além do hambúrguer com um “preço ridículo” (foi assim que alguns clientes adjetivaram a promoção), o Whatafuck também fez uma promoção de cerveja pelo mesmo valor: 1 real. Os adoradores da marca que adquirissem os 300 primeiros copos garantiram o desconto na bebida idealizada por Daniel Mocellin e Anuar Tarabai especialmente para a casa, a Whatafucking Beer, da cervejaria F#%*ing Beer. A cerveja é uma delícia, uma “bera foda”, como alguns carinhosamente a intitulam. É uma cerveja estilo APA (American Pale Ale) feita com lúpulos norte-americanos e uma adição nada tímida de dry hopping. Assista aqui esse vídeo manifesto da cerveja da casa.

Acompanhe a presença digital das caras, algo absolutamente leve, irreverente e que obviamente está acoplado no jeito de ser da marca. A começar pelo site da marca e sem falar do perfil no Facebook e o Instagram, o meu preferido. Eles sabem dialogar com seu público. Aprenderam e calibrar o tom da comunicacao. A receita é: humor com leveza e com uma generosa pitada de saber jogar o jogo da internet, gifs, memes e sátiras são usadas à exaustão.

wtf-pabloHoje eu uso o case do Whatafuck em sala de aula. Como uma marca a ser seguida. Como um benchmark! Não simplesmente pelo chope gelado nem pelo delicioso hamburger que desce sorrateiramente de um engenhoso tobogã construído na primeira loja da rede. Quer entrar em um segmento de mercado? Simples: estude esse mercado antes, veja o que todos seus concorrentes fazem e busca ocupar um espaço que ninguém ocupa. Se todos eles vão para um lado, vá pelo outro lado. Isso é construção de posicionamento de marca em estado brutp. Eu não resisto obviamente e tenho utilizado o case Whatafuck nas minhas aulas que ministro no MBA na FIA-USP e na FGV, como uma empresa que deve servir como referência. Uma estratégia de marca absolutamente contemporânea (pra não falar pós-moderna). Whatafuck é referência não apenas em termos gastronômicos (o hamburger é incrivelmente gostoso) mas principalmente em termos de irreverência e paixão aos detalhes. Construção de marca é justamente isso: paixão aos detalhes. E é o que eles seguem como mantra: uma forma genuína de tocar operação, desde a maneira amistosa como tratam os funcionários, até a escolha de matérias-primas feita com capricho e esmero. Whatafuck entendeu a regra do jogo de construção de relevância de marca: eles tocam a vida das pessoas! Uma estratégia de construção de posicionamento de marca que destoa completamente do que vemos nos livros de marketing e nas falas de grandes autoridades da pesquisa de marcas. Bem-vindo à era das marcas deliciosamente e politicamente incorretas. #WTF!

Marcos Hiller é especialista em branding, editor desse site e fã do Whatafuck.

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