Benvindo ao mundo da ficção científica

por @MarcosHiller
Em 1964, o visionário professor Marshall McLuhan disse que “na espaçonave Terra, não há passageiros, somos todos tripulação”. Impressionante a nitidez da fala do pesquisador canadense, que estaria com um século de vida esse ano, em trazer uma visão tão lúcida e contemporânea como essa já na década de 60. E essa célebre frase de McLuhan traduz de forma muito pertinente esse verdadeiro universo de ficção científica que vivemos hoje. Não somos meros passageiros passivos e olhando pela janelinha dessa imensa espaçonave, mas sim seres humanos altamente participativos, prontos para performar, e modulando o tempo todo a cena em que estamos inseridos.
Vivemos hoje em um mundo conectado, mas norteado pela constante interrupção. Ao mesmo tempo que estamos hiperconectados, somos interrompidos o tempo todo por toques, notificações, pop-ups sirenes e alarmes. Estamos em um mundo veloz, sintético e ansioso, regido por 140 caracteres. Se concentrar por mais de 20 minutos em uma única atividade é tarefa para poucos. Os jovens, ou nativos digitais, só conseguem ser criativos com 17 abas abertas em suas telas, com a TV ligada, atirando passarinhos com um estilingue e com iPod no ouvido para nossa alegria. Nós nascemos em uma era analógica e estamos migrando para uma era digital, e eles já nasceram dentro do processo digital.
Estamos entrando de forma contundente numa nova cultura do espetáculo, em uma nova configuração da economia, sociedade, política e vida cotidiana, que envolve novas formas culturais e de novos modelos de experiência. “A chamada era da informação é, na realidade, a era do excesso de informação”, disse com muita serenidade Paulo Vaz, pesquisador da UFRJ, há 10 anos. Nosso cérebro e nossa cognição simplesmente não dão conta de tamanho volume de informação que nos tenta impactar por dia. Por exemplo, um exemplar da edição de domingo do The New York Times contém mais informação do que a absorvida ao longo da vida por um indivíduo culto no século XVIII. 
Vive-se hoje em um universo hiperconectado, onde as máquinas falam e os homens se comunicam por meio de próteses artificiais. As novas gerações incorporam plenamente essas tecnologias e as colam ao corpo como um elemento a mais de suas roupas: calças, jaquetas e mochilas são fabricados com lugar para o celular. A moda faz com que a corporabilidade abrigue as tecnologias. Quando chego diante da porta de um shopping e ela se abre sozinha, ou quando abro meu carro como o botãozinho e o bip do chaveiro, não é o chaveiro que está abrindo a porta, é meu corpo, é uma extensão do meu braço, como se eu fosse Anakin Skywalker, provido de uma força sobrenatural. 
Benvindo à era do YouTube, a canal de televisão mundial. O Twitter é a maturação da internet e posso me conectar e ser ouvido por qualquer pessoa do planeta. Estamos o tempo todo diante de telas, de painéis, de tecnologias touch-screen, e entramos no epicentro da era do consumo simbólico. Quando as pessoas adquirem um iPhone, por exemplo, estão não apenas comprando um aparato tecnológico, como também vivenciando certo estilo de vida (digital) e se inscrevendo num imaginário tecnológico que enfatiza as ideias de inovação, elegância e distinção econômica, diz com muita sabedoria o pesquisador Erick Felinto da UERJ.
As pessoas, nessa sociedade intensa e paradoxal, buscam uma fixação narcísica por meio das redes sociais, e as marcas também procuram adotar jogos discursivos sedutores nesses novos e envolventes espaços digitais, dizia também McLuhan há 50 anos. E com a explosão das redes sociais, fenômenos desse século, vemos essa sábia frase de McLuhan cristalizada de forma sublime. Esses novos ambientes virtuais são baseados em plataformas digitais e dispositivos interativos móveis de compartilhamento de arquivos e informações, é são um exemplo muito claro dessa condição social-histórica imprecisa, hesitante e incompleta, complementa Felinto.
Já Sherry Turkcle, uma brilhante cientista do MIT, diz que com muita pertinência que nós estamos “always on”. E quando estamos conectados, estamos na verdade, negando uma certa solidão. Se estou sozinho em casa logado no meu Facebook, eu não estou mais sozinho, estou fazendo parte da vida de outra centena de pessoas e de forma muito íntima. A tecnologia ao mesmo tempo que nos aproxima de pessoas queridas, nos distancia delas. Outro grande pensador contemporâneo, o argentino Nestór Garcia Canclini diz que “chega-se a fenômenos de autismo e desconexão social, devido às pessoas preferirem antes ficar na frente da tela do que relacionar-se com interlocutores em lugares fisicamente localizados”. O fato de eu estar conectado o tempo todo não significa que estou interagindo o tempo todo. E nesse universo, muito mais importante do que estarmos simplesmente presentes nas atraentes e viciantes redes sociais, é preciso saber o que fazer lá, saber estar presente de forma relevante e coerente.
Vive-se em um mundo de histórias que se iniciam e não finalizam, cada vez mais interligado por intercâmbios de ordem mercadológica. Todo mundo praticamente está ocupado all the time fazendo business com tudo: diversão, conhecimento, avatares, casamento, sexualidade, estética, reprodução, saúde, beleza, identidade, ideias. As pessoas se tornam um verdadeiro empreendimento comercial nesse novo contexto que vivemos, e com a cauda longa de Chris Anderson mais forte do que nunca. As sociedades vivem hoje um processo de reorganização, sobretudo no âmbito cultural, social, econômico e político, e fica muito evidente como esses fenômenos tecnológicos, como e explosão de redes sem fio, por exemplo, acelera a dinâmica das relações, onde posso postar tudo que eu quiser, onde eu quiser e na hora que quiser. Não queremos mais estar sucumbidos na impessoalidade massa, pois agora quero estar conectado apenas com pessoas e marcas que ajam como eu ajo. 
Benvindo! Estamos inseridos no chamado Turbocapitalismo, uma saborosa mistura de Blade Runner, com 2 xícaras de Segredo do Abismo, 3 colheres de Avatar, e uma pitada de Matrix. May the force be with us!