Desintoxicação digital? Ainda não!

 

por @MarcosHiller
 
Por que temos que estar em todas as redes sociais? Por que desconfiamos de alguém que não está no Facebook? Por que, ao chegar uma notificação em nosso smartphone que fomos marcados em uma foto, temos que parar tudo naquele exato instante para conferir? Por que nos intoxicamos com essas novas redes digitais e ficamos online praticamente o dia inteiro? Pra mim, todas essas são perguntas ainda sem respostas claras. O fato é que essas chamadas redes sociais fazem parte de uma nova revolução digital que impacta nossas relações com as pessoas e com as marcas. Sim, há pensadores contemporâneos que classificam esse cenário que vivemos hoje como uma verdadeira revolução. A exemplo do que foi a revolução do surgimento da escrita, a revolução industrial, a revolução gutemberguiana da imprensa ou a revolução francesa séculos atrás, enxerga-se esse fenômeno da web e seus desdobramentos digitais como uma verdadeira revolução. Eu sou obrigado a concordar.
 
Podemos dar um zoom out e analisar as redes sociais sob diversos aspectos. Desde uma ideia que surgiu dentro de um dormitório de Harvard, onde o judeu neoliberal Mark Zuckerberg criou uma das empresas mais inovadoras do mundo, e que recentemente contratou o multipremiado arquiteto Frank Gehry  – responsável pelo emblemático edifício do Museu Guggenheim de Bilbao – para desenvolver o projeto de expansão da sede de sua empresa em Palo Alto (foto ao lado). Ao mesmo tempo que as ações da empresa sofrem uma certa turbulência, Zuckerberg encomendou um conjunto que ocupará um terreno de 90 mil m², na área conhecida como Menlo Park, onde está o quartel-general da gigante das redes sociais. Zuckerberg concebeu o Facebook para conectar as pessoas entre si? Eu prefiro acreditar que não.
 
Podemos também analisar as redes sociais como meras plataformas mercadológicas onde as marcas criam, nada mais nada menos, do que mais um ponto de contato com seus consumidores e demais públicos de interesse. A partir do momento que uma empresa decide criar um fanpage ou um perfil no Twitter ela precisa estar ciente e preparada que está abrindo a guarda, pois ela acaba de deixar escancarada uma porta “digital”, ou seja, um porta mais online, mais nefrálgica, mais exposta e mais mensurável. Ela acaba de criar um “touch-point” tão importante quanto o seu 0800, tão importante quanto ao balcão de sua loja ou um anúncio publicitário, e até mesmo tão importante como a forma que se relaciona com um fornecedor, afinal tudo comunica a marca. Quer expor sua marca nas redes sociais? A receita de bolo é: prepare-se, capacite-se, planeje-se, crie um processo, atue de forma relevante e muito, mas muito criteriosa. E contrate um nerd.
 
Por fim, pode-se analisar as redes sociais como esses novos ambientes digitais onde se constroem jogos discursivos e narrativas envolventes. O magnetismo criado pelas redes sociais é intenso pois no mundo online não há todas as exigências do mundo real, certo? Ligar para dar parabéns a cada um dos meus 7 aniversariantes custa dinheiro, custa tempo e custa ter que ficar pendurado do celular ouvindo histórias dele que não estou afim de ouvir naquele momento. Prefiro escrever um “parabéns e tudo de bom” e viva o Ctrl+C e Ctrl+V. A quem prefira nem ligar e nem dar parabéns via Facebook, e simplesmente “curte” a mensagem de parabéns de um terceiro. Assunto resolvido!
 
Nesse novo ecossistema digital, todos tendem a criar um discurso narcísico, afinal a troco de quê eu deveria expor nesses espaços que eu estou triste, ou que terminei meu namoro, ou então dizer que aquele novo emprego que consegui não vai nada bem. Muito pelo contrário, nesses novos espaços digitais minha vida é bela, estou sempre jantando em lugares transados, as minhas piadas e frases clichês são as mais originais e a minha filha vestida de caipirinha é mais bonitinha do bairro. Todos estão fazendo vigília sobre tudo que posto, publico e compartilho.
 
A quem tenha adotado recentemente o chamado “detox digital” ou processo de desintoxicação digital, afinal essas coisas viciam e ceifam nossa atenção durante boa parte do dia, certo? Uma conhecida minha me relatou recentemente que saiu do Facebook. Logicamente, ela me disse que eu suspeitava: quando você pede para sair, a rede social não mata sua conta e te dá a opção de deixar sua conta adormecida. Você pode voltar quando bem entender e como se nada tivesse acontecido. Problema é que se você sair do Facebook e ninguém perceber, como um colega de sala meu sabiamente ponderou.
 
Todo mundo está no Facebook hoje, certo? Errado! Cerca de apenas 30% de nossa população brasileira usa a rede. Recentemente em uma rápida sondagem que fiz em uma sala de aula que eu leciono, perguntei a todos: “Quem não usa Facebook, levante a mão!”. Cerca de uns 10 estudantes levantaram a mão e as justificativas que ouvi foram: o Facebook é muito chique (parei para pensar depois, e eles tem total razão, o “look-and-feel” do Facebook é azul, e na teoria das cores azul é nobreza; o próprio nome “Facebook” é um rebuscado nome gringo); já outra parcela disse que preferia a fazendinha do velho e bom Orkut.
 
Detox digital? Obrigado, mas ainda não. Afinal, como é que eu iria divulgar esse texto sem o meu Facebook?