Ronald, vai pro divã!
por @marcoshiller
Toda marca tem uma essência. Ou pelo menos, toda marca deveria ter uma essência. E a essência de uma marca nada mais é o que ela representa, são aqueles valores que estão enraizados em absolutamente tudo que uma organização se propõe a comunicar, na forma como seus funcionários de comportam, a maneira como a marca se apresenta em anúncios publicitários, o seu posicionamento, ou a forma como ela lida com órgãos de imprensa, mercado, entidades, etc. E traduzir essa essência para seus consumidores de forma coerente, consistente e honesta é uma tarefa difícil.
Eu acabo de sair da estação de metrô Paraíso aqui em São Paulo e me deparei com um anúncio do McDonald’s que deixou muito intrigado. Era um anúncio muito bonito e clean, como são habitualmente todos os anúncios da marca (parabéns, Taterka!), informando que agora o McDonald’s nos dá a opção de pedirmos uma saladinha, ao invés da batata frita, na nossa McOferta. Para mim, aquilo foi um exemplo clássico de uma marca que não está sendo coerente com a sua essência. Vejamos: quando pensamos em McDonald’s o que vem à nossa mente? Na minha mente vem: comida rápida, hamburgeres saborosos, imensos, muito calóricos, e lojas lotadas onde eu sento em cadeiras com assento duro. Para mim, McDonald’s é isso, e imagino que para boa parte das pessoas que lêem esse texto: idem. E agora, eles querem nos dizer que são saudáveis, que seus alimentos são light e que eles se preocupam com nossa saúde. Pra mim, essa historia não cola e eu encaixo isso como um clássico exemplo de marca que não está sendo fair com o seu DNA, com a sua essência.
Algumas pessoas podem até contra-argumentar que isso se trata de um reposicionamento de marca, ou um processo de adaptação da empresa a essa nova tendência de se levar uma vida saudável. Problema nenhum da marca fazer isso, mas acho que McDonald’s está pilotando isso de forma muito brusca e muito abrupta. Na minha visão, esse novo mote “da saladinha” fere demais o seu legado original: peça pelo número, coma rápido, se alimente e saia logo que outra pessoa precisa sentar no seu lugar.
No verso do folheto de bandeja que o McDonald’s coloca em suas lojas, podemos ler uma tabela onde eles explicam de forma super detalhada quais os componentes nutricionais de cada item do cardápio. A gordura saturada de um Big Tasty, por exemplo, já supre em 109% nossa necessidade diária. E em paralelo, eles nos vendem hoje em dia as cenouritas do Ronald, ou nos oferecem maçãzinha e iogurte com frutas vermelhas. E ao mesmo tempo, continuam nos sugerindo um Super McShake de Coco que supre em módicos 45% nossa necessidade diária de gorduras saturadas. Em algumas lojas eles oferecem espaços como o McCafé, com poltronas fofas, iluminação baixa e espressos bem tirados. Para mim, isso não é autêntico da marca McDonald’s. Talvez a criação de uma nova marca, totalmente apartada, resolveria esse desalinhamento de discurso. Mas não, eles insistem em comunicar toda essa nova entrega com o mesmo “M” amarelo. Aqui deixo uma dica: ao acabar de ler esse texto, vá até uma loja McDonald’s e peça um Cheddar McMelt acompanhado de uma água de coco (harmoniza muito!).
As virtudes mais belas do processo de comunicação de uma empresa com seu mercado é a consistência e a coerência com a essência de sua marca. E na autoridade de meus 33 anos, acho que McDonald’s não está sendo honesto com seus valores originais. Oras, McDonald’s! Apesar de ser uma das 10 marcas mais valiosas no último ranking da consultoria Millward Brown, acho que vocês deveriam levar o Ronald para o divã. Mais que isso, já na primeira sessão eu pediria que fosse lido em alto em bom tom uma frase que foi imortalizada pelo filósofo alemão Friedrich Nietzsche: “Torna-te quem tu és”.