FALSO BRILHO: a ponto cego no uso de celebridades na publicidade

por Marcos Hiller

Executar um posicionamento de marca por meio do uso de uma celebridade é um modo de ferramenta publicitária usada há muito anos e à exaustão. Vamos a alguns exemplos. Reinaldo Gianechinni já esteve como seu rosto na campanha do Banco do Brasil, do site de empregos Catho e na Chilli Beans. Neymar foi utilizado amplamente na última Copa do Mundo com Sadia e em outras dezenas de campanhas no passado de marcas como Lupo, Nextel, Baruel, Claro, Panasonic, Cerveja Proibida, Guaraná Antarctica, Santander, Unilever, Puma, Nike e Volkswagem Gol. O global Luciano Huck, outro rosto famoso, já esteve com Centrum, HDI, Sadia, Magalu, Ypê, XP Investimentos e Banco Itaú. Ivete Sangalo foi garota-propaganda de onze campanhas em rápido levantamento que fiz aqui: L’Oréal, Avon, TAM, VIVO, Schin, Giraffas, Insinuante, Governo da Bahia, Credicard Hall, Conselho Nacional de Procuradores, Tramontina, entre outras. Rodrigo Faro, outro nome famoso que as marcas amam, estampou seu sorriso em campanhas da EMS, Banco Pan, Ricardo Eletro, Americanas, Seara, Arcor, City Lar e da Oral B. Inclusive ele é um dos donos do ACELERAÍ, uma empresa que uberiza o uso de celebridades na comunicação de marcas de todos os tamanhos. Aqui já deixo um couvert da minha tese: 99% dessas iniciativas ajuda a construir a marca do artista e favorece principalmente a conta bancária dele. Pois construção de equity de marca pra valer é o que se vê menos aqui.

Já a belíssima e incomparável Gisele Bündchen estrelou uma outra infinidade de campanhas para Vivara, C6 Bank, C&A, ONU, P&G e Sky e, curiosamente, a modelo sempre lidera a lista das celebridades mais vistas na publicidade, e uma das mais caras. Em 2022, fomos surpreendidos com a tradicional campanha do Itaú onde tem usado habitualmente a menininha Alice, Fernanda Montenegro, Ludmila, João Gomes e Marcos Mion com seu filho Romeu. Mion que, por sua vez, bombou nesse ano com Mercado Livre, Chevrolet, Tim, Globoplay e tantas outras propagandas. Aliás, preciso escrever um texto sobre o menina Alice e como o neoliberalismo coloniza até mesmo os modos de infância de crianças. Aguardem!

Nesse último mês de dezembro, Itaú usou Madonna, junto de Fernanda Montenegro de novo, além de Benjor, Marta, Ronaldo, etc… e havia usado recentemente o eterno Rocky Balboa junto com Mion. Vale comentar também que a Rede Globo liberou recentemente seus artistas para fazerem livremente campanhas publicitárias. Bial já foi usado na Fiat. Fátima Bernardes esteve com Presunto Seara. A cara do BBB Tadeu Schmidt ficou mais rico ainda com Ademicon Consórcios, Omo e Bradesco Seguros. Já o Galvão está em todas praticamente: TikTok, Visa, Pixbet, Serasa, Tetrapak e sua própria marca de vinhos Bueno Wines.

Supostamente, o uso de toda essa miríade de artistas joga luz na exposição da marca, atrai consumidores e, principalmente, faz encher os bolsos desses artistas com cachês advindos dos gordos orçamentos de marketing das marcas. E ao observarmos esse vasto cardápio de marcas e as suas celebridades escolhidas, a impressão que fica é que: as marcas escolhem nomes que simplesmente estão em evidência no momento e acreditam que isso gera potência de exposição midiática. Mas elas se enganam, pois o que todas essas ações fazem fundamentalmente é contribuir ainda mais na construção da marca pessoal do artista e não da marca anunciante em si. Pensa comigo! Nós como consumidores somos expostos a essa avalanche de comunicação, com todos esses artistas sendo usados à exaustão em centenas de campanhas ao mesmo tempo. Nossa capacidade de memorização é cada vez mais restrita, confundimos cada vez mais, uma fragmentação de telas absurda, não temos capacidade cognitiva de lembrar quem está onde, em qual campanha, etc. Sempre prego em minhas aulas que as marcas deveriam escolher pela evidência da pessoa em si logicamente, mas principalmente também pelo nível de conexão que a celebridade tem ao dialogar com seu respectivo público-alvo, e mais que isso, o quanto os atributos dessa marca estão alinhados com os atributos da celebridade selecionada. Aliás, essa última variável deveria ser o principal critério de seleção de um rosto famoso para protagonizar a campanha de uma marca. Em 2022, me peguei pensando… Que atributo Cléo Pires empresta para o Santander? Juro que fico com essa questão na cabeça. Que atributo o Cowboy ganhador do BBB2 empresta para o Santander? Me ajudem! Pra mim: é o pix caindo bolso da celebridade e nada mais.

Calma! Há esperança…. A marca-ícone Louis Vuitton, que atua no segmento de moda e de luxo há décadas, já deu aula sobre isso. Eles nunca tinham feito campanhas em mídias mais tradicionais. Mas no início dos anos 2000 começou a fazer. Escolheu, de forma cirúrgica pessoas como Madonna, Francis Ford Coppola e sua filha Sophia, Bono, Maradona, Zidane, Keith Richards, Pelé, Sean Connery, Angelina Jolie e até mesmo o ex-líder soviético Mikhail Gorbachev (RIP). O que todos têm em comum? Um perfeito e impecável alinhamento de DNA com a marca francesa. Todas são pessoas ícones no que fazem, nunca foram vistas em campanhas publicitárias e emprestam uma série de atributos relevantes para a LV. A marca de cafés especiais da Nestlé, a Nespresso, também faz um trabalho impecável nesse sentido. George Clooney é a perfeita corporificação da marca. Um homem meia idade, sóbrio, grisalho, charmosão, discreto, ou seja, exatamente os mesmo valores que estão presentes no DNA da boutique de cafés espressos em cápsulas.

No entanto, o que observamos, de forma mais frequente aqui no Brasil são marcas se associando a influenciadores e artistas simplesmente pela suposta potência midiática que ele carrega, e não por um perfeito alinhamento da essência de ambas as partes. Associar marcas a celebridade é uma prática que não é de hoje. Sabendo fazer funciona super bem. O uso de celebridades-ícones sempre foi muito habitual. A atriz Michele Pfifer com a marca Lux Luxo nos anos 80, Cindy Crawford com a marca Rolex nos anos 90, e mais recentemente Gisele Bundchen associando sua imagem a marca como Colcci e Pantene. Elas possuem uma aura mítica, bela e sedutora sempre desejável, afinal a beleza pode ser um prenúncio da felicidade. Uma marca quando toma a decisão de se associar a uma celebridade está claramente assumindo riscos em nome de um calculado ganho exponencial de lembrança de marca e que, logicamente, se reverte em ganho de brand awareness e posteriormente pode gerar aumento de vendas. Uma pesquisa de brand track para pedir isso é essencial. Se quiser, me liga que falamos mais sobre isso.

De novo, quem sai ganhando com essa prática despudorada de uso excessivo da mesma celebridades em uma centena de campanhas é cada vez mais a própria celebridade e não o anunciante, que originalmente deveria ser o grande beneficiado dessa prática. Faça uma sondagem com pessoas aleatórias: em que campanha Huck está protagonizando nesse momento? e Mion? e Neymar? Eu aposto que sairão respostas das mais aleatórias e dissonantes. Praticamente ninguém lembrará de nada. Igual uso de publicidade em placas de campo de futebol, onde o recall é praticamente zero. Construção de marca é longo prazo e principalmente, ter consistência, ou seja, falar a mesma coisa por muita vezes, todas as vezes, em todos os locais e da mesma forma. O artista oferece seu sorriso e seu carisma. Ele é quem ganha a relevância, a exposição e o pix na conta… e fica cada vez mais rico com esses e novos contratos que virão. Sigamos errando até quando?

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